Ambiente virtual de debate metodológico em Ciência da Informação, pesquisa científica e produção social de conhecimento

quarta-feira, 4 de maio de 2011

As prioridades nacionais

Copiado de Grand Strategy Brazil

Hoje, em reunião com os demais coordenadores de pós da UnB, para analisar o corte que a CAPES jura que não fez em nossos orçamentos, fiquei atônito ao descobrir que um dos critérios para a concessão de bolsas para a pós-graduação é uma lista de prioridades por área, inalterada desde os tempos do governo militar. Pelos critérios de tal lista, o Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação, que subiu da nota 4 para 5 na última avaliação trienal, tem um quinhão menor do que alguns programas de conceito 3 ou 4.  Vamos a ela:
  • Prioridade 1: Engenharias, Multidisciplinar, Ciências Biológicas, Ciências Exatas e da Terra (exceto Geociências e Matemática: Probabilidade e Estatística), Ciências Agrárias (exceto Medicina Veterinária), Ciências da Saúde (apenas Farmacologia e Saúde Coletiva).
  • Prioridade 2:  restante sub-áreas excluídas em 1.
  • Prioridade 3: Ciências Humanas, Ciências Sociais Aplicadas, Letras, Linguística e Artes.
Tal lista implica ainda em limites quanto à quantidade de bolsas por programas. No caso do PPGCINF-UnB, como somos 5 (o que é alto), nosso limite é de 20 bolsas, independentemente de nossa necessidade, de nosso desempenho com elas e de nosso tamanho. Na última estimativa feita, ainda esse mês, nossa demanda seria de 25 bolsas, algo que só poderia ocorrer se não fôssemos a última prioridade. Aliás, se estivéssemos listados na elite das engenharias ("engenharia da informação"?) poderíamos ter as 25 bolsas sendo apenas nota 4, permanecendo no patamar anterior. O único programa nota máxima da UnB, a Antropologia, para a CAPES é absolutamente não-prioritário. 

Essa lista, além de ser mais um dos entulhos tecnocráticos que emperram o desenvolvimento científico nacional, subverte o que deveria ser a máxima diretriz da universidade: o mérito. A desculpa atual é que determinadas áreas são mais cruciais para alavancar PD&I (o discurso da moda) do que outras. O paradoxal é que quando a moda era outra, tempos atrás, as prioridades eram as mesmas. A análise não pode ser generalizada por grandes áreas nacionais. Possivelmente o avanço da engenharia civil no Sudeste contribui mais para PD&I do que no Acre (tanto que lá os programas de pós são de outras áreas). De modo similar, pela proximidade com os órgãos governamentais, o potencial que o PPGCINF tem para contribuir com a gestão do estado Brasileiro não é a mesmo que terá um programa que tenha outras características. 

Se estamos falando de ciência, a lógica da bola de cristal deveria ser posta de lado. Achar que tais áreas darão melhor resultado e não outras é quiromancia. Como coordenador de programa de Ciência da Informação, posso elencar inúmeras contribuições que poderíamos dar à inovação, a começar por uma gestão mais eficiente e transparente de recursos informacionais, que possibilaria maior eficiência na gestão dos recursos público e, portanto maior capacidade de execução de avanço tecnológico (eficácia). Colegas, de outras áreas, também devem ter seus argumentos para se definirem como prioritários. O problema é que um debate nesse nível não resolveria o problema em seu âmago, apesar de ser sempre desejável sair do modelo autocrático - das coisas pré-definidas pelo poder (ou pelo oráculo que lê nas entranhas de animais) -, para um modelo sofista, no qual a melhor capacidade de argumentação e convencimento representaria maior proximidade com a verdade. Não se trata disso na academia. Quem provar que está avançando e contribuindo mais deverá ter mais espaços. Por que não estabelecer as prioridades a partir da análise de resultados? Afinal, dizem, o Brasil é campeão de avaliação científica e devotamos boa parte de nossa energia produtiva para sermos avaliados por nossos resultados. A lógica do mérito, no entanto, tem que tomar cuidado para não fazer o anti-mérito e punir quem não avança tão efetivamente.


Veja mais anotações sobre a política de fomento da CAPES e a extinção do Programa Prof aqui.

Um comentário:

  1. Parabéns ao prof. André pelo oportuno texto: claro, elegante e ilustrativo para os demais coordenadores e professores dos Programas de Pós-Graduação da UnB. A UnB precisa acordar! Cordialmente,
    Volnei Garrafa - Coordenador PPGBioética-FS

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